terça-feira, 15 de dezembro de 2015

NEM GOLPISMO, NEM AUSTERICÍDIO: A SAÍDA É PELA ESQUERDA!



Por Felipe Bandeira*


Maquiavel nos diz que nunca se deve prosseguir uma crise para escapar de uma guerra. Mesmo porque, completa o autor, dela não se foge, apenas se adia em desvantagem própria. 

O bloco político do governo está fragmentado, padecendo de uma disputa encarniçada entre os grupos que compunham o dito pacto de governabilidade. Esta massa falida, ao deflagrar o “salve-se quem puder” e aprofundar o quadro econômico recessivo, retira direitos e piora de sobremaneira as condições de vida da classe trabalhadora.

As saídas factíveis no curto prazo são difíceis. Por sua vez, o governo segue implementando uma política que representa um verdadeiro “austericídio”, resultando em maior concentração da renda, aumento do desemprego e da pobreza.

A despeito das tensões políticas do último período, pode-se mesmo afirmar que 2015 é em certa medida síntese de um conteúdo político que não somente se distingue, mas que desembaraça as “divergências” construídas pelo reformismo fraco do governismo e a direita clássica. 

O conteúdo econômico da crise

O capital só existe enquanto ciclo. A sua produção e reprodução só é possível quando os mesmos caminhos são percorridos sucessivas vezes. Neste sentido, a crise de 2007/2008 representou um ponto de ruptura. Para corrigir este ponto de coagulação, a fração financeira do capital tem forçado um ajustamento violento no mundo inteiro, a exemplo da Grécia, Portugal, Espanha, e na América Latina, Argentina, Venezuela e o Brasil.

Em particular na América Latina, associado ao ajuste internacional do capital, observa-se um esgotamento de projetos “nacionais”, como o Chavismo na Venezuela, o kirchnerismo na Argentina e o Lulismo no Brasil. Embora seja muito arriscado analisar de forma simplificada esses governos, regionalmente há um traço de esgotamento de governos reformistas, sobretudo no caso brasileiro e argentino, associado a uma reversão rápida de avanços conquistados nos últimos anos. 

O Brasil é um caso emblemático. A maior distribuição da renda, conjugada com a convergência da economia para o rentismo, constituiu a base do pacto social, que em linhas gerais, manteve inalterada os privilégios de castas políticas formadas logo após a abertura democrática. Em termos econômicos, o PT continuou e aprofundou as medidas iniciadas por governos neoliberais como de Itamar Franco e FHC.

O ponto fora da curva foi justamente o avanço qualitativo do perfil do trabalho no Brasil. O aumento dos postos de trabalho formais na primeira década de 2000 representou uma alteração importante no padrão de mão de obra. Segundo Pochmann, dos 21 milhões de postos de trabalhos criados no período, a grande maioria (94,8%) foram com rendimentos de até 1,5 salário mínimo. 

Esta maior formalização dos postos de trabalho, associado ao ciclo das commodities, sustentaram o ciclo de expansão do mercado interno no último período, consolidando o PT como uma potência eleitoral, principalmente nos setores que constituíam a base da pirâmide social. 

Este quadro, entretanto, começou a ruir por uma combinação de fatores internos e externos que pressionaram os rumos da política econômica, provocando conflitos distributivos cada vez maiores, degradando as contas nacionais em detrimento da um sistema de especulação de capitais. 

Divergências da esquerda

Muitas tradições dentro da esquerda convergem no sentido de anular o papel das massas e salientar as figuras centrais, tornando os processos sociais um fato mítico e heroico, ao mesmo tempo, que individualizado e romântico. 

O culto aos heróis atenua em certo sentido o conteúdo de classe. Precisamos compreender, como ressalta Florestan Fernandes, os processos políticos como fenômeno sociológico de classe. 

A dimensão da luta de classes está associada ao caráter objetivo do desenvolvimento do capitalismo. O quanto se avança e o quanto se retrocede não pode ser resultado única e exclusivamente de ações individuais.

Posto neste sentido, o processo histórico recente deixou claro que o raio de transformação dos governos petista é muito pequeno, esgotando-se pouco mais de uma década depois da subida de Lula na rampa do Palácio do Planalto. Observamos o PT se afastar das tarefas históricas impostas por sua base social. Por outro lado, setores mais conservadores do país assumiram postos estratégicos dentro do governo.

Mesmo as situações reacionárias, como o pretenso golpe do impeachment não se produz por encomenda, como setores governistas propagandeiam. Esse processo implícito ou explícito se relaciona em cadeia. A incapacidade dos governos petista em atinar e avançar com reformas estruturais, como a agrária e a urbana, garantiu conteúdo político aos golpistas.

Não há saídas factíveis com nenhum dos blocos constituídos. A firmeza da ação revolucionária, mesmo dentro da ordem, depende de formas de solidariedade de classe, de capacidade de mobilização e organização para levar até o fim as transformações necessárias. Precisamos nos aproximar do conteúdo político que deu forma as mobilizações de junho no Brasil em 2013.

O Impeachment é a saída?

Sabemos que muitos setores do governo e oposição se servem de todas as formas da legalidade, facilmente mobilizando grandes aparatos jurídicos em benefício próprio. Esses setores têm patrocinado à mão armada seus interesses vitais. Enquanto campos da esquerda optaram por opções táticas defensivas - muitas vezes blindando o governo - os setores burgueses avançaram em nível financeiro, estatal e militar, aperfeiçoando seu grande aparato de repressão.

De concessão em concessão, a colaboração entre classes do PT foi deixando passar retiradas de direitos, enfraquecendo a capacidade de mobilização de sindicatos e movimentos sociais.

Entretanto, junho de 2013 representou uma ruptura desta tendência. Um conjunto de forças sociais se colocaram a favor de um novo bloco político. Embora as massas mobilizadas apresentassem múltiplas pautas e linhas, existia um elemento que os unificava, a indignação generalizada contra o modelo político.

Para seguir o legado de junho, precisamos nos descolar das pautas orquestradas pela direita clássica. Obviamente o impeachment é uma destas e não atenderá as exigências dos avanços sociais, mas sim, aprofundará o quadro caótico de retirada de direitos. Michel Temer, Eduardo Cunha, Renan Calheiros, todos na linha sucessória de Dilma, caso ocorra o impeachment, estão sendo investigados por corrupção ativa e lavagem de dinheiro, além de representarem o setor mais conservador da política brasileira.

Não há como aceitar o golpismo da direita, muito menos o austericídio de Dilma. A saída vai além dos limites da massa falida que disputam o poder. O conteúdo e a forma desta alternativa é o que estamos a disputar nas ruas.

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* É coordenador Geral da UES, estudante de Ciências Econômicas UFOPA e militante do movimento de juventude Junto! 

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